sábado, 29 de outubro de 2011

Certificação verde como via da sustentabilidade?


A etiquetagem - processo de certificação da sustentabilidade e eficiência energética de edificações e aparelhos - é, sem dúvida, de importante utilidade pública e um tema a ser debatido no âmbito do conceito-chave da Conferência do Rio+20, a Economia Verde. Justamente por isso, merecem uma reflexão um pouco mais cuidadosa. É necessário rever o emprego de adjetivos como “eficiente” e “sustentável” respaldado por selos, rótulos, LABEL, certificações, índices, entre outros termos que têm representado uma agregação de valor a produtos comercializados. A etiquetagem está sendo debatida na Câmara Legislativa e esta casa pretende normatizar o instrumento. De fato, fornecer informações sobre as mercadorias é uma prática saudável caso estas informações sejam confiáveis.

No entanto, métodos de definição das marcas de conformidade da rotulagem atualmente utilizadas na classificação de eficiência e sustentabilidade se constituem de alguns poucos parâmetros, geralmente insuficientes para garantir qualidade ambiental e apresentar credenciais de “selos ambientais”. Na etiquetagem de edificações, dentre os parâmetros escolhidos estão forma ótima, absortância da cor que reveste a construção, sistema de ventilação e outros poucos parâmetros que, de fato, podem garantir maior conforto e economia energética. Porém, existe uma infinidade de outras técnicas construtivas, como bioconstruções, com propriedades térmicas muito interessantes e não são sequer catalogados dentre as alternativas certificáveis. Ademais, os parâmetros manejo do solo, drenagem das águas pluviais, acessibilidade, mobilidade, reuso de água, destinação dos resíduos sólidos em alguns métodos de certificação são considerados apenas acessórios, ou seja, garantem “1 ponto a mais” em bonificação. Estes aspectos são, porém, sine qua non para a minimização dos impactos causados pela construção, e não, meramente, acessórios.

A eficiência energética é também uma terminologia que dever receber uma reflexão cuidadosa, pois não tem uma acepção unívoca e absoluta, mas é uma variável dependente do ambiente e do sistema social em que está inserido. Vejamos o caso das tecnologias de iluminação; lâmpadas incandescentes são consideradas de alto gasto de energia em comparação com as fluorescentes. No entanto, lâmpadas incandescentes representam maior conforto visual e de não produzem resíduo tóxico de mercúrio, em comparação às fluorescentes, que têm um gasto grande para ativar seu reator, assim, para circunstâncias em que estas têm que ser acessas e desligadas várias vezes ao dia, esta tecnologia pode se mostrar ineficientes.

Vemos que os desafios para implantar um sistema de certificação são muitos. Chegamos ao paradoxo de ter como referência de construções “verdes” o empreendimento imobiliário Noroeste. Inserido em última mancha de cerrado do plano piloto, o projeto promove a fragmentação da vegetação; sobreposto à área de maior recarga de aqüífero da bacia do Paranoá, o projeto aumenta a impermeabilização e diminui a disponibilidade hídrica da bacia; tendo sua construção iniciada no período em que o DF estava sem governo em uma área que está sob júdice, sua construção representou violência física e psicológica à comunidade indígena ali estabelecida tradicionalmente. Esses e outros parâmetros evidenciam o desafio da operacionalização, e principalmente, da validação de selos desse cunho. É preciso lembrar que o Manual Verde do bairro – assinado pelo trio Paulo Octavio, Cássio Tanigush e Antônio Gomes e plagiado da certificadora americana ASHRAEnunca chegou a ser implementado. Mas o Jornal Comunidade de hoje 29/10/2011, no Caderno “Imóveis & Construção” traz a manchete “Bairro que brota da consciência Ambiental” com financiamento da Caixa Econômica por ser o primeiro “ecologicamente correto” do país.

Definir a validade de selos ambientais é um problema técnico e epistemológico. Mas respaldar um bairro como sustentável têm sido entendido frequentemente como uma questão política e econômica. Não existe apenas uma "inovação verde" mas múltiplas opções e é, sobretudo, a manutenção dessa multiplicidade de formas construtivas que reside a essência da transição para a sustentabilidade. Os selos devem deixar de ser um instrumento de marketing, meramente, e se tornem mecanismos de avaliar de forma integral processos, insumos e resíduos envolvidos na produção de mercadorias, sejam unidades residenciais ou comerciais, utilizando critérios como avaliação de ciclo de vida, sustentabilidade social e tendências como as cidades em transição.

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